Eu preciso falar sobre erros e contradições na Bíblia.

Vez ou outra alguém fala sobre contradições na Bíblia. Por exemplo, Jesus curou dois cegos ou só um?

Mateus diz que foram dois, ao sair da cidade:

E, saindo eles de Jericó, seguiu-o grande multidão. E eis que dois cegos, sentados à beira do caminho, ouvindo que Jesus passava, clamaram, dizendo: Senhor, Filho de Davi, tem misericórdia de nós!
― Mt 20.29-30

Marcos também diz que o episódio se deu à saída de Jericó, mas era um cego e não dois:

E depois foram para Jericó. E saindo ele de Jericó com seus discípulos e uma grande multidão, Bartimeu, o cego, filho de Timeu, estava sentado à beira do caminho, mendigando.
― Mc 10.46

Lucas também disse que era um cego, mas quando eles chegavam à cidade:

E aconteceu que chegando ele perto de Jericó, estava um cego sentado à beira do caminho, mendigando.
― Lc 18.35

Só mais um exemplo e prosseguiremos. Em Levítico 11.13-19 há uma relação de aves que não poderiam servir de alimento para o povo judeu. A última dessas aves é o morcego. Opa! Morcego não é uma ave, é um mamífero. E agora?

Antes de falar sobre o que está acontecendo, é importante saber que algumas diferenças encontradas nas versões impressas da Bíblia se devem ao tipo de texto original utilizado na tradução.

Para traduzir o Velho Testamento, os eruditos, geralmente, utilizam o Códice de Leningrado, também chamado de Texto Massorético, contido na Bíblia Hebraica Stuttgartensia. Mas há outros textos hebraicos. Por exemplo, o Codex Aleppo e os pergaminhos do Mar Morto.

Para o Novo Testamento temos basicamente dois tipos de originais: o Texto Bizantino, oriundo da Grécia, também chamado de Texto Recebido, e o Texto Alexandrino, oriundo do Egito, também chamado de Texto Crítico.

Temos atualmente mais de 5.500 manuscritos gregos. O Texto Recebido abrange cerca de 95 por cento deles, enquanto o Texto Crítico está baseado nos outros cerca de 5 por cento.

O Texto Recebido foi usado nas igrejas desde os primórdios e foi o texto usado pelos reformadores no século 16, junto com o Texto Massorético, para traduzir a Bíblia para os mais diversos idiomas. O Texto Crítico surgiu por obra de dois teólogos ingleses, Westcott e Hort, no final do século 19, mais exatamente em 1881, baseados principalmente no códice Vaticano e no códice Sinaítico.

Há muitas diferenças entre eles. Para citar só o Novo Testamento, o Texto Crítico é cerca de dez por cento menor que o Texto Recebido, faltando nele palavras, versículos e até passagens inteiras. Além disso, Westcott e Hort introduziram arbitrariamente diversas modificações no texto a cada nova edição, o qual ficava diferente da anterior, tendo surgido milhares de alterações. Para se informar melhor sobre isto, você pode ler a excelente obra de Wilbur Pickering: Qual o Texto Original do Novo Testamento?, disponível gratuitamente na internet.

Em português, há somente três traduções feitas a partir do Texto Recebido:

(1) Almeida Corrigida Fiel – ACF, da Sociedade Bíblica Trinitariana do Brasil
(2) Almeida Revista e Corrigida 1899 – Casa Publicadora Paulista
(3) King James Fiel 1611 – BV Books (esta publicação, porém, contém muitos erros de impressão e gramaticais; faltou esmero na revisão; por isso, recomendo as duas primeiras)

Mas voltemos aos erros e contradições da Bíblia.

Quanto ao morcego, a palavra “ave” (עוף) em hebraico antigo significava qualquer criatura voadora; portanto, esse animal se encaixa nesta definição. Obviamente, hoje não se poderia usar o termo “ave” para designar o morcego, mas seria um anacronismo julgar algo escrito cerca de 3.500 anos atrás usando as classificações científicas modernas.

Quanto aos cegos de Jericó, é mais provável que tenham sido dois (cf. Mateus, testemunha ocular), mas como Marcos identifica um deles pelo nome (Bartimeu), possivelmente o conheceu pessoalmente depois e deu ênfase somente à sua cura, omitindo a outra. O que importa, porém, é que os textos afirmam que Jesus esteve em Jericó e ali fez milagres.

Quero concluir, dizendo que essas poucas discrepâncias que encontramos na Bíblia servem para validar o que o apóstolo Paulo escreveu:

Toda a Escritura é soprada por Deus e proveitosa para ensinar, para repreender, para corrigir, para instruir em retidão, para que o homem de Deus seja completo, e capacitado plenamente para toda boa obra.
― 2 Tm 3.16-17

A expressão “soprada por Deus” é theopneustos (θεόπνευστος), em grego, que se traduz geralmente como “inspirada por Deus” ou “divinamente inspirada”. Isto quer dizer que Deus soprou na mente dos homens que escreveram a Bíblia o que ele queria que fosse escrito, mas não ditou palavra por palavra, nem anulou o intelecto de cada escritor. Pelo contrário, usou os recursos e o estilo de cada um deles, bem como suas limitações intelectuais e culturais, e permitiu eventuais falhas de memória.

Daí, algumas diferenças nas narrativas, as quais deixam claro que a Bíblia não é produto da deliberação de alguém que quisesse fundar uma religião (Constantino, por exemplo, como dizem alguns) e que também não sofreu alterações ao longo dos séculos (como afirmam outros); se fosse assim, tais desacordos teriam sido cuidadosamente eliminados do texto sagrado, que neste caso não seria tão sagrado assim.

E finalmente esclareço que nenhum dos contrastes textuais se dá em qualquer trecho relevante doutrinariamente, o que significa que a fé cristã não sofre qualquer abalo. Tudo o que é essencial na Escritura está muito bem explicitado, sem qualquer dúvida. Por isso, o apóstolo João pôde afirmar categoricamente:

Estes, porém, foram escritos para que vocês creiam que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus, e para que crendo tenham vida em seu nome.
― Jo 20.30-31

José Moreno, um bispo anglicano cheio de erros, mas que confia na inerrância da palavra de Deus registrada na Bíblia.

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Igreja Anglicana das Américas – Via Media
Uma igreja comprometida com a Palavra de Deus
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